O que você sabe sobre Lei ou Contrato de Franquias?

É sabido que o empreendedorismo não é tecnicamente difundido no Brasil. Diante disso, além do risco natural do mercado, o brasileiro conta com a falta de informação necessária ao sucesso do seu empreendimento, fator que contribui substancialmente para a alta taxa de insucesso das empresas que se aventuram nesse ecossistema tão incerto.

Medidas para aumentar as chances de sucesso de qualquer investimento estão em constante evolução e um remédio forte para isso é contrato de franquia. É uma forma inteligente do empreendedor minimizar os riscos decorrentes da atividade empresarial, tendo em vista que o negócio a ser explorado já possui um modelo pronto e validado no mercado.

Para que isso efetivamente ocorra, faz-se necessário a implantação de regramento básico com vistas a evitar fraudes e garantir segurança jurídica aos contratantes.

A fim de demonstrar a importância desse segmento, dados da Associação Brasileira de Franchising refletem um crescimento de 1,9% no número de lojas abertas no primeiro trimestre de 2021, mesmo em meio ao cenário negativo devido as medidas restritivas para combate à pandemia da COVID-19.[1]

No Brasil, a primeira diretriz formal que dispôs acerca do contrato de franquia foi a Lei 8.955/1990, cuja redação era imprecisa e superficial.

Como dito, medidas paliativas são pensadas a todo tempo a fim de mitigar os riscos. Nesse sentido, foi editada a nova Lei de Franquias, a Lei 13.966/2019.

Além de ter uma redação mais clara e objetiva, a lei trouxe diversas inovações que acarretaram maior transparência e segurança para os que desejam ingressar no mercado de franquias.

Em seu artigo 1º, traz a definição do sistema de franquia empresarial, sendo aquele “pelo qual um franqueador autoriza por meio de contrato um franqueado a usar marcas e outros objetos de propriedade intelectual, sempre associados ao direito de produção ou distribuição exclusiva ou não exclusiva de produtos ou serviços e também ao direito de uso de métodos e sistemas de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem caracterizar relação de consumo ou vínculo empregatício em relação ao franqueado ou a seus empregados, ainda que durante o período de treinamento”.[2]

O dispositivo colocou uma pá de cal (ou ao menos tentou) na natureza jurídica que envolve o contrato. Por vezes o judiciário se utilizou das normas existentes no Código de Defesa do Consumidor para dirimir questões relativas a um contrato de franquia.

No mesmo sentido, resta claro que, respeitadas as premissas do referido contrato, não há que se cogitar relação de emprego entre franqueador e franqueado, outra confusão não rara de acontecer.

Outras inovações significativas dizem respeito à Circular de Oferta de Franquia (COF), documento obrigatório a ser entregue pelo franqueador ao franqueado, no prazo mínimo de 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou do pagamento de qualquer taxa pelo franqueado ao franqueador.

Dentre as principais mudanças, encontra-se a obrigatoriedade de relacionar todos os franqueados, subfranqueados ou subfranqueadores que tenham se desligado da rede nos últimos 24 (vinte e quatro) meses. Essa obrigação gera mais segurança naquele franqueado mais diligente, pontuando as razões de saída dos relacionados e os riscos do negócio.

Ainda em relação à COF, a nova lei traz também, dentre outras, a exigência de regras específicas sobre:

  • Concorrência territorial entre as unidades próprias e franqueadas;
  • Inclusão de regras de suporte ao franqueado;
  • Possibilidade de incorporação de inovações tecnológicas às franquias;
  • Especificação quanto aos custos, duração e conteúdo do treinamento a ser dado aos franqueados;
  • Especificações quanto aos padrões de instalações;
  • Ampliação do conceito de know-how para definição de efeitos após término do contrato de franquia;
  • Estabelecimento de regras para a transferência ou sucessão;
  • Estipulação de cotas mínimas de compra e estabelecimento de critérios prévios para recusa de produtos ou serviços exigidos;
  • Indicação da existência de conselho ou associação de franqueados;
  • Estipulação prévia de penalidades, multas ou indenizações, definindo valores e situações de aplicação.

Destaca-se ainda a possibilidade do franqueador sublocar ao franqueado o ponto comercial no qual se desenvolverá as atividades em valor superior ao da locação, desde que haja previsão expressa na COF e no contrato, bem como não gere onerosidade excessiva ao franqueado. Atribui ainda a legitimidade a qualquer uma das partes, franqueador e franqueado, para propor a renovação do contrato locatício.

Ainda como fator que merece destaque, está a previsão da possibilidade de eleição de juízo arbitral para a solução de conflitos. Aqui, recomenda-se que haja indicação prévia de possíveis Câmaras Arbitrais a fim de avaliar os custos de implementação, sob pena de no futuro qualquer das partes encontrar trava financeira para questionar o teor do contrato.

Quanto ao questionamento futuro acerca do que fora contratado, cabe ressaltar recente decisão do Superior Tribunal de Justiça no Resp. 1.881.149. O caso foi de um franqueado que tentou se esquivar dos deveres contratuais em razão do contrato ser apócrifo (não ter sido formalmente assinado).

Ponderou o STJ entre o rigor formal do instrumento, que não constava a assinatura do franqueado, e o comportamento das partes ao longo do tempo.

No caso em análise, o franqueado, apesar de não ter expressamente assinado o contrato, passou a frequentar os treinamentos, instalou a franquia e se utilizou da marca da franqueadora como se tivesse de fato assinado o contrato.

Prevaleceu a boa-fé objetiva sobre o rigor técnico, de forma que a corte da cidadania aplicou o brocardo Venire Contra Factum Proprium, que proíbe o comportamento contraditório contratual onde a parte visa beneficiar-se da própria torpeza.

Também cabe lembrar que a decisão está em consonância com o artigo 113, § 1º, dispositivo alterado pela Lei da Liberdade Econômica, prezando pela boa fé, comportamento das partes, bem como as práticas existentes no mercado relativas ao tipo de negócio.

Por fim, destaca-se que a nova lei traz diretrizes mínimas a serem observadas nos contratos de franquias internacionais. Dentre elas, a exigência de tradução para língua portuguesa às expensas do franqueador e a de constituição e manutenção de representante legal no foro escolhido pelo contrato internacional de franquias.

Conclui-se que as mudanças legislativas acerca do modelo de franquias é salutar, de modo que as relações tendem a ficar mais transparentes, gerando maior segurança jurídica a esse ecossistema, desde que tomadas as devidas precauções e com auxílio de profissionais gabaritados para tanto.

 

[1] Pesquisa de desempenho 1º trimestre 2021. Disponível em: https://www.abf.com.br/wp-content/uploads/2021/06/Desempenho-Franchising-1TRI-2021.pdf

[2] Lei 13.966 de 23 de dezembro de 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13966.htm

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