A importância do Contrato Social

O contrato social é o documento mais importante ao se constituir uma sociedade. Apesar disso, é bastante comum que pequenos e médios empreendedores banalizem esse documento.

No mais das vezes, os empresários utilizam um modelo padrão retirado da internet, ou um contrato padronizado fornecido pelo contador da empresa a ser constituída. Cabe fazer a ressalva que, em hipótese alguma, o intuito das informações aqui prestadas é diminuir a importância ou competência dos contadores, pois estes são essenciais para o bom funcionamento de uma sociedade.

Pois bem, passamos a explicar um pouco mais sobre o esquecido contrato social. Segundo a teoria contratualista de Tulio Ascarelli, o contrato social possui natureza jurídica contratual, sui generis. Isso significa que ele é dotado de características diferentes dos contratos gerais bilaterais que conhecemos.

Algumas das diferenças entre os contratos gerais e os contratos sociais é que neste há a presença da chamada affectio societatis, que é a união de esforços dos sócios em prol de um objetivo em comum, constituindo um forte elo de ligação da pessoa de cada sócio. Além disso, há o fato de ser plurilateral, ou seja, várias pessoas podem fazer parte dele, com direitos e deveres não apenas em relação a uma outra parte, mas sim em relação a todas as pessoas que compõem o quadro social.

Este contrato é o documento que o empreendedor formaliza e regula a atividade a ser explorada pela empresa. Deve ser escrito por instrumento público ou particular e deve possuir o registro, que é condição legal para que a sociedade adquira personalidade jurídica. No caso de sociedade empresária, o registro deverá ser feito perante as Juntas Comerciais. Tratando-se de sociedade simples, perante o Registro Civil de Pessoas Jurídicas.

Aqui já aproveitamos para sanar uma dúvida comum que diz respeito ao contrato feito por instrumento público. Caso seja adotado esse regime, as alterações futuras não precisam ser feitas da mesma forma, podendo ser por instrumento particular.

O prazo para ser levado a registro é de 30 (trinta) dias subsequentes à constituição, nos termos dos artigos 998 e 1.151, § 1º do Código Civil. Caso seja feito requerimento após esse prazo, o registro somente produzirá efeitos a partir da data de sua concessão, não retroagindo à data de assinatura contrato. Destacamos também que o responsável por requerer o registro responde por perdas e danos em caso de demora.

O artigo 997 do Código Civil traz as matérias que, obrigatoriamente, devem constar no contrato social, vejamos:

Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará:

I – nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas;

II – denominação, objeto, sede e prazo da sociedade;

III – capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;

IV – a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la;

V – as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços;

VI – as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições;

VII – a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas;

VIII – se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. 

Tendo em vista que a sociedade limitada é o tipo societário mais difundido no Brasil, cabe ressaltar que os incisos V e VIII não se aplicam a elas por peculiaridades próprias.  De todo modo, esse tipo societário será objeto de um novo artigo para que possamos nos concentrar na essencialidade do contrato social.

Além das cláusulas obrigatórias do contrato social, os sócios têm liberdade para fazer constar no referido documento aquilo que melhor entenderem em relação à atividade social.  Pelo princípio da Intervenção Mínima do Estado, os sócios podem estabelecer que a sociedade seja regulada pelas regras que desejarem, não havendo um padrão a ser seguido. Caso não criem essas normas, vão cair nas regras gerais dispostas no Código Civil, Código de Processo Civil e demais legislações esparsas.

Apesar da liberdade dada, alguns empreendedores ficam com receio de realizar essa “criatividade contratual”. Porém não há o que temer, já que a própria legislação dá o amparo para isso. Com o advento da Lei 13.874/2019, a chamada Lei da Liberdade Econômica, isso ficou ainda mais claro, por meio do que dispõe o artigo 3º, VIII, que afirma ser direito da pessoa jurídica a garantia de que os negócios jurídicos paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, desde que respeitadas as normas de ordem pública.

Agora vamos exemplificar cinco situações que, reguladas via contrato social, facilitam a vida do empreendedor.

1 – Cláusula impeditiva de oneração de quotas – Aqui o contrato social pode impedir que os sócios, a título oneroso ou gratuito, alienem, vendam, transfiram ou cedam a outro sócio ou a terceiros suas quotas sem a anuência dos demais sócios. Também existe a possibilidade de cláusula proibindo que os sócios caucionem, constituam usufruto ou qualquer outra forma de constituição de ônus, encargo ou gravame sobra as quotas sociais.

2 – Exclusão extrajudicial de sócios minoritários – Os sócios podem prever condições e procedimentos para que um sócio minoritário possa ser excluído extrajudicialmente, por exemplo, listando o que se considera atos de inegável gravidade aptos a caracterizar a exclusão por justa causa. É preferível que haja essa previsão, pois sem dúvidas isso trará economia de tempo e dinheiro para a sociedade.

3 – Critérios para apuração de haveres e respectivo pagamento – Caso algum sócio deseje sair da sociedade, como será a apuração de haveres? E o prazo para pagamento? Não havendo a previsão de determinada forma de apuração e de pagamento, a sociedade cai na regra geral que, em alguns casos, pode ser desastrosa para a atividade empresarial, tendo em vista o exíguo prazo de noventa dias para pagamento.

4 – Morte/Divórcio de sócio – Caso algum sócio venha a falecer ou se divorciar, haverá a permissão de entrada dos herdeiros ou do ex-cônjuge na sociedade? É interessante para os sócios remanescentes que isso aconteça? Geralmente pode se estabelecer três saídas para isso: a vedação total do ingresso dos herdeiros ou ex-cônjuge na sociedade; a permissão com o cumprimento de alguns requisitos como qualificação ou formação acadêmica, por exemplo; e a entrada do herdeiro ou ex-cônjuge na sociedade mas sem atuação direta na empresa, somente participando dos resultados da sociedade.

5 – Regência supletiva da Lei 6.404/76 – A regra geral é que, nos casos omissos, as sociedades limitadas serão regidas supletivamente pelas regras atinentes às sociedades simples. Porém, havendo previsão expressa no contrato social, essa regência supletiva poderá ser por meio da Lei das Sociedades Anônimas, nos termos autorizadores do artigo 1.053 do Código Civil. Com isso, em caso de omissão das normas específicas das sociedades limitadas, a sociedade poderá se valer das normas referentes às sociedades anônimas, desde que não haja incompatibilidade, a exemplo da adoção de quotas em tesouraria, quotas preferenciais, criação de conselho de administração, etc.

Diante do exposto, é de extrema importância o diálogo com um profissional que faça o empreendedor abrir a mente quanto aos possíveis acontecimentos futuros, passando a regulá-los desde a constituição da sociedade por meio do contrato social. Não tomar essa medida pode fazer com que, em um cenário de crise, os sócios se vejam em uma situação tão desconfortável que inviabilize até a própria continuidade da atividade empresarial.

 

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