A extinção dos contratos administrativos na Nova Lei de Licitações

Os contratos em geral, como qualquer negócio jurídico, extinguem-se, normalmente, pelo cumprimento das prestações pactuadas ou pelo decurso do prazo previsto. No entanto, conforme lembra Flávio Tartuce[1], um contrato também pode ser extinto antes ou durante a sua execução, por causas anteriores e contemporâneas a sua celebração ou, ainda, por causas supervenientes.

 

I – Da nulidades dos contratos

As hipóteses de invalidade contratual decorrem, em regra, de fatos anteriores a sua celebração. Além dos aspectos gerais aplicáveis da Teoria das Nulidades do negócio jurídico, lembra a nova LLC que o contrato poderá ser declarado nulo em virtude de irregularidade insanável verificada no procedimento licitatório.

No tema, o novo diploma buscou maior alinhamento à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que, agora, conta com disposições[2] sobre segurança jurídica e eficiência na criação e na aplicação do direito público.

Assim, prevê o art. 147 da Lei n. 14.133/2021, em respeito também ao princípio da conservação dos negócios jurídicos, que a decisão que declarar a nulidade de contrato somente será adotada na hipótese em que se revelar medida de interesse público, devendo a Administração ponderar:

 

I – impactos econômicos e financeiros decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;

II – riscos sociais, ambientais e à segurança da população local decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;

III – motivação social e ambiental do contrato;

IV – custo da deterioração ou da perda das parcelas executadas;

V – despesa necessária à preservação das instalações e dos serviços já executados;

VI – despesa inerente à desmobilização e ao posterior retorno às atividades;

VII – medidas efetivamente adotadas pelo titular do órgão ou entidade para o saneamento dos indícios de irregularidades apontados;

VIII – custo total e estágio de execução física e financeira dos contratos, dos convênios, das obras ou das parcelas envolvidas;

IX – fechamento de postos de trabalho diretos e indiretos em razão da paralisação;

X – custo para realização de nova licitação ou celebração de novo contrato;

XI – custo de oportunidade do capital durante o período de paralisação.

 

O § 2º do mesmo artigo ainda permite a modulação de efeitos da decisão, com o objetivo de evitar a solução de continuidade da atividade administrativa. Autoriza o dispositivo que a declaração de nulidade do contrato tenha eficácia apenas em momento futuro, por tempo suficiente para a conclusão de uma nova contratação (até seis meses, prorrogável uma única vez).

 

II – Das demais hipóteses de extinção

A Lei n. 14.133/2021 dedica o Capítulo VIII às hipóteses de rescisão contratual, por fatos posteriores ou supervenientes a sua celebração. Na clássica divisão doutrinária[3], temos aqui as seguintes espécies: resolução (extinção do contrato por descumprimento) e resilição ( dissolução por vontade bilateral ou unilateral).

Os contratos administrativos regidos pela Lei n. 14.133/2021, de acordo com art. 138, poderão ser extintos: unilateralmente pela Administração; consensualmente, por acordo entre as partes; ou por decisão arbitral/judicial.

Independentemente da hipótese, alerta o art. 137 que todas deverão ser formalmente motivadas nos autos do processo, assegurando-se, sempre, o contraditório e a ampla defesa. São elas:

 

I – não cumprimento ou cumprimento irregular de normas editalícias ou de cláusulas contratuais, de especificações, de projetos ou de prazos;

II – desatendimento das determinações regulares emitidas pela autoridade designada para acompanhar e fiscalizar sua execução ou por autoridade superior;

III – alteração social ou modificação da finalidade ou da estrutura da empresa que restrinja sua capacidade de concluir o contrato;

IV – decretação de falência ou de insolvência civil, dissolução da sociedade ou falecimento do contratado;

V – caso fortuito ou força maior, regularmente comprovados, impeditivos da execução do contrato;

VI – atraso na obtenção da licença ambiental, ou impossibilidade de obtê-la, ou alteração substancial do anteprojeto que dela resultar, ainda que obtida no prazo previsto;

VII – atraso na liberação das áreas sujeitas a desapropriação, a desocupação ou a servidão administrativa, ou impossibilidade de liberação dessas áreas;

VIII – razões de interesse público, justificadas pela autoridade máxima do órgão ou da entidade contratante;

IX – não cumprimento das obrigações relativas à reserva de cargos prevista em lei, bem como em outras normas específicas, para pessoa com deficiência, para reabilitado da Previdência Social ou para aprendiz.

 

Registra-se que apenas três incisos são novos: (VI) atraso na obtenção da licença ambiental, impossibilidade de obtê-la ou alteração substancial do anteprojeto que dela resultar, ainda que obtida no prazo previsto; (VII) atraso na liberação das áreas sujeitas à desapropriação, à desocupação ou à servidão administrativa ou impossibilidade de liberação dessas áreas; e (IX) não cumprimento das obrigações relativas à reserva de cargos prevista em lei, bem como em outras normas específicas, para pessoa com deficiência, para reabilitado da Previdência Social ou para aprendiz.

Com ligeiras alterações em relação a Lei n. 8.666/93 , o § 2º do art. 137 da Lei n. 14.133/21 acrescenta as hipóteses em que o contratado terá direito à extinção do contrato:

I – supressão, por parte da Administração, de obras, serviços ou compras que acarrete modificação do valor inicial do contrato além do limite permitido no art. 125 desta Lei;

II – suspensão de execução do contrato, por ordem escrita da Administração, por prazo superior a 3 (três) meses[4];

III – repetidas suspensões que totalizem 90 (noventa) dias úteis, independentemente do pagamento obrigatório de indenização pelas sucessivas e contratualmente imprevistas desmobilizações e mobilizações e outras previstas[5];

IV – atraso superior a 2 (dois) meses, contado da emissão da nota fiscal, dos pagamentos ou de parcelas de pagamentos devidos pela Administração por despesas de obras, serviços ou fornecimentos[6];

V – não liberação pela Administração, nos prazos contratuais, de área, local ou objeto, para execução de obra, serviço ou fornecimento, e de fontes de materiais naturais especificadas no projeto, inclusive devido a atraso ou descumprimento das obrigações atribuídas pelo contrato à Administração relacionadas a desapropriação, a desocupação de áreas públicas ou a licenciamento ambiental.

 

Registra-se, por fim, notadamente em razão da relevância para o momento de pandemia, que a nova LLC, como a norma anterior, determina que a rescisão prevista nos incisos II, III, IV não será possível em caso de calamidade pública, de grave perturbação da ordem interna ou de guerra.

 

 

[1] TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 3: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 12. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017.

[2]  As alterações no Decreto-Lei nº 4.657 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), de 4 de setembro de 1942, foram feitas pela Lei nº 13.655/2018.

[3]   TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 3: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 12. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017.

[4] O art. 79 do inciso XIV da Lei n. 8666/93 previa que a rescisão seria possível em caso  de suspensão por prazo superior a 120 (cento e vinte) dias.

[5] O prazo, na legislação anterior, para suspensões sucessivas também era de 120 (cento e vinte) dias.

[6] O inciso XV do mesmo artigo da Lei n. 8666/93 estabelecia que o atraso no pagamento deveria ser superior a 90 (noventa) dias.

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